É em um cenário hostil que a Mostra Ecofalante de Cinema chega à sua nona edição, a partir desta quarta-feira (12). Hostil por causa da devastação que a pandemia de coronavírus causou no setor cultural, mas também pela escalada de um discurso político avesso ao ecologismo no país.
LEONARDO SANCHEZ/SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Totalmente online, pela primeira vez, o festival dedicado a filmes que debatem questões socioambientais reúne este ano 98 títulos de 24 países. Eles serão exibidos em três plataformas de streaming diferentes, de forma gratuita, por mais de um mês. É um número menor do que o do ano passado -que teve 132 produções em sua seleção-, mas que pode ser visto com entusiasmo depois dos reveses que atingiram a Ecofalante neste ano. Originalmente programada para junho, a mostra foi adiada em meio às incertezas provocadas pela Covid-19 e, então, se apropriou da internet para que pudesse acontecer.”Em fevereiro nós já percebemos que não ia dar pra fazer o festival em junho. Aí em março notamos que a situação seria muito mais séria aqui no Brasil e começamos, então, a estudar a alternativa digital”, diz Chico Guariba, diretor da Ecofalante.
“O que nós sempre tivemos em mente é que a gente não podia deixar de ter essas discussões socioambientais esse ano, porque os problemas nessa área não sumiram, eles pioraram. E como nós já tínhamos parte dos recursos financeiros, a gente tinha que fazer acontecer.”
Devido aos impactos econômicos do coronavírus, a Ecofalante perdeu cerca de 40% da verba de anos anteriores –”o dinheiro que costumava vir da prefeitura foi para os hospitais”– e, com isso, precisou reduzir seu tamanho, perdendo algumas seções. Mas algo de positivo veio desse cenário: se antes o festival era um dos principais eventos cinematográficos de São Paulo, este ano ele vai alcançar todo o Brasil. “Nessa adversidade a gente vai poder atingir um público maior e atender à população de todo país que quer consumir esse tipo de informação sobre o meio-ambiente”, diz Guariba.
E as novas proporções que a Ecofalante ganhou já puderam ser sentidas na Semana do Meio Ambiente, em junho, quando aconteceu uma espécie de aquecimento para a mostra. Os títulos e os debates que ocorreram na ocasião foram assistidos em 490 cidades brasileiras, em todos os estados. Agora, os filmes selecionados para exibição a partir desta quarta estarão disponíveis em levas. Com datas e horários pré-definidos, as sessões virtuais foram pensadas para que a mostra mantivesse uma estrutura de festival, mesmo que à distância.
Entre os destaques da programação estão os estrangeiros “Jawline: Ascensão e Queda de Austyn Tester”, premiado em Sundance, “Botando pra Quebrar”, exibido em Cannes, e “Tomates, Molho e Wagner”, que tentou uma vaga para a Grécia no Oscar. Já entre os brasileiros estão “Acqua Movie”, protagonizado por Alessandra Negrini, e o curta-metragem “Tuã Ingugu”, dirigido por Daniela Thomas. Há ainda uma nova seção, dedicada a velhas produções nacionais premiadas, e debates virtuais.
Esses e outros títulos vão discutir diversos temas abrigados pelo guarda-chuva da ecologia, em um momento difícil para quem defende o tema no Brasil -até porque, Guariba destaca, epidemias como a atual têm relação direta com a questão ambiental. “A mostra sempre foi um local de resistência, porque os problemas socioambientais estão muito presentes na realidade brasileira. E o momento atual do país se faz muito presente na filmografia deste ano e nos textos que usamos como referências para a curadoria, que fazem uma ponte com o momento de pandemia que estamos vivendo.”