Se comparado a 2019, volume de apreensões em 2020 é cerca de 60% menor
Por Débora Mariotto
A fiscalização cada vez mais rígida da Receita Federal do Brasil (RFB), no Porto de Paranaguá, já impediu que seis mil quilos de cocaína chegassem ao seu destino no ano de 2020. O trabalho de enfrentamento ao tráfico internacional de drogas é complexo e relaciona uma grande cadeia de combate ao crime, envolvendo equipes de vigilância das alfândegas de todo o Brasil, escritórios de inteligência da Receita Federal, interação com órgãos de segurança nacionais e internacionais, além da utilização de cães farejadores e o auxílio da tecnologia, através de scanners que identificam a presença de mercadorias suspeitas em meio às cargas lícitas.Foi com esse aparato que, no ano de 2019, mais de 15 toneladas de cocaína foram interceptadas no Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP).
Segundo a RFB, o “prejuízo” dado às quadrilhas envolvidas nesse tipo de crime provocou adaptações por parte dos traficantes. “Em 2019, o principal método utilizado foi o rip-on/rip-off, quando a droga é inserida no contêiner sem o conhecimento do depositário e do exportador. As cargas eram de madeira, celulose, sacaria e congelados. Em 2020, o método que mais tem sido utilizado é a ocultação da droga em meio às mercadorias. Nestes casos, a droga é colocada no contêiner antes de sua entrada no terminal de embarque.”, explica o delegado da Receita Federal em Paranaguá, Gerson Zanetti Faucz.
As tentativas de burlar a fiscalização também incluem a diminuição da quantidade de droga inserida nos contêineres. Enquanto, em 2019, a RFB chegou a encontrar cargas de duas toneladas, em 2020 as quantias variam entre 100 e 200 kg, na maioria das vezes. A apreensão de valor mais expressivo, neste ano, ocorreu no dia 19 de março, quando 766 kg de cocaína foram encontrados em um contêiner que iria para a França. O trabalho desenvolvido no terminal paranaense inspirou alfândegas em outros portos.
“Em 2020, aumentaram muito as apreensões em outros portos, como Salvador com 4.923 kg (apreendidos até o mês de junho). Isto mostra que o trabalho que se iniciou em Santos e Paranaguá está agora disseminado em outras alfândegas do Brasil, contribuindo para a maior efetividade no combate ao tráfico internacional de drogas em nosso país”, avalia Faucz.
Números e características
Em todo o ano de 2019, foram 27 apreensões, totalizando 15,2 mil quilos. A média é de 1,2 mil quilos por mês. Em 20 das apreensões, o método utilizado era o rip-on/rip-off. Em quatro, a droga estava oculta em cargas de madeira ou compensado. Houve um caso em que a carga ilícita foi encontrada no pátio do TCP e nas duas interceptações restantes, os tabletes com entorpecentes estavam em meio a sacas de açúcar e ácido fólico.
Já em 2020, até o dia 04 de dezembro, foram 19 apreensões realizadas, totalizando 6,08 mil quilos de cocaína. Nesse caso, a média aproximada é de 507 kg por mês. O número é cerca de 60% menor que o registrado no ano anterior. Apesar da queda na média – que é reflexo da diminuição da quantia de droga inserida nos contêineres – o Porto de Paranaguá lidera o ranking de apreensões entre os portos do Paraná e de Santa Catarina, são esses terminais que compõem a 9ª Região Fiscal da RFB.
Já no ranking nacional, a liderança é do Porto de Santos, seguido por Salvador, Paranaguá e São Francisco do Sul. Outra característica importante é com relação ao destino das drogas. Em 2019, a maioria dos contêineres tinham como destino a Bélgica e a Holanda. Em menor quantidade, foram registradas tentativas de envio de drogas para a Espanha, França, Itália e Portugal. Uma das cargas, que foi apreendida no mês de março, não teve o país de destino definido porque ainda não estava inserida em um contêiner quando foi encontrada.
Em 2020, o principal destino dos contêineres interceptados era, também, a Bélgica. Na sequência, aparecem Holanda, Espanha, Itália, França e Costa do Marfim. No mês de fevereiro, houve uma apreensão no pátio do TCP e, por isso, o país de destino da droga não foi identificado. Após as apreensões, a Receita Federal entrega as cargas de cocaína à Polícia Federal, que deve investigar o crime e incinerar a droga.
Operação Enterprise
A Operação Enterprise, deflagrada em 23 de novembro, foi a maior realizada neste ano pela Polícia Federal e já é considerada, ainda, uma das maiores da história do combate ao tráfico internacional de drogas. Foram quase três anos de investigação da quadrilha que, em seu braço paranaense, tinha como núcleo logístico a cidade de Paranaguá, além de possuir ramificações nos estados da Bahia, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e São Paulo.
O inquérito apontou que a droga percorria um longo caminho antes de chegar aos portos brasileiros e tinha como origens a Bolívia e o Paraguai. A estrutura usada pelos criminosos envolvia vans, caminhões e aeronaves. “Eles traziam a cocaína de avião da Bolívia e deixavam no interior de São Paulo. Outro grupo logístico transportava essa cocaína até a capital. Ali era armazenado e depois seguia por diversas formas para os portos”, afirmou Sergio Luís de Oliveira, chefe dos Grupos Especiais de Investigações Sensíveis (Gise/PF), vinculado à Polícia Federal. Uma das aeronaves apreendidas estava avaliada em US$ 20 milhões.
“Quando você deflagra uma operação como essa, quando descapitaliza uma organização criminosa, você identifica núcleos financeiros. E quando aplica o inesperado e chega à cúpula, tem acesso aos dados, tem uma operação para muitos anos, muitas fases. É possível chega muito, muito longe” afirmou o delegado da Polícia Federal e coordenador Nacional de Repressão a Drogas, Armas e Facções Criminosas, Elvis Secco.
Embora a Operação Enterprise tenha sido considerada bem sucedida, a Polícia Federal entende que há outros grupos criminosos atuando na área e que, por isso, seguirá os trabalhos de investigação.
Duas apreensões em um dia
Apenas doze dias após a mega operação da PF, na sexta-feira (04), duas novas apreensões foram realizadas no TCP. Primeiro, a Receita Federal realizou identificou 322 kg de cocaína em um contêiner carregado de cerâmicas, que seguiria para o Porto de Valência, na Espanha. Mais tarde, 222 kg da droga foram encontrados em um contêiner com destino ao porto italiano de Gioia Tauro. Neste caso, a carga lícita era de sementes de gergelim.